Companheiros:
Apesar de o incidente que passo a descrever não ter ocorrido por me ter deslocado a Budapeste na qualidade de autocaravanista, não posso deixar de chamar aqui a vossa atenção para a "mafiosisse" dirigida aos turistas, incluindo naturalmente aos autocaravanistas portugueses, que cometam o erro de agir como eu e os meus amigos fomos recentemente induzidos a agir.
A carta que consequentemente dirigi ao embaixador da Hungria, abaixo reproduzida, e que mais parece o argumento de um filme, foi acompanhada pelos bilhetes, e pelo recibo emitido pelos fiscais do Metro, bem como por cópia do meu bilhete de identidade.
Fico a aguardar uma resposta da embaixada da Hungria mas uma coisa é certa: nós, portugueses, que nos achamos cidadãos de um dos países mais corruptos da Europa (e com 100% de razão!) temos ainda algumas coisas a aprender com os outros...
Quem tiver paciência (o melhor está reservado para o fim da carta) que leia o que se segue e depois diga de sua razão. Sempre estou curioso para conhecer as opiniões e ideias dos companheiros que se queiram pronunciar...
Então aí vai:
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Exmo. Sr. Embaixador da República da Hungria:
Venho muito respeitosamente requerer a atenção de V. Exa. para o episódio que passo a descrever:
• Visitei Budapeste nos dias 14, 15, 16 e 17 de Outubro, juntamente com a minha esposa e com um casal amigo.
• No dia 16, Sábado, depois de um longo passeio pela Andrássy Útca, e de um almoço num restaurante situado perto da Praça dos Heróis (“Robinson”), resolvemos, pela primeira e única vez durante a nossa estadia, recorrer ao Metro de Budapeste para regressar ao hotel Marriot, perto da Praça Vigado.
• Para esse efeito entrámos numa estação situada perto da Praça dos Heróis (“Hösök”?).
• Pretendíamos viajar até Vörösmarty Tér, pois pareceu-nos ser no mapa a estação de Metro situada mais perto do nosso hotel.
• À entrada da estação encontravam-se dois funcionários, fardados e com braçadeiras, que fiscalizavam as entradas e saídas dos passageiros.
• Pedi a um desses funcionários ajuda para adquirir os bilhetes, apontando no nosso mapa para a localização aproximada do nosso destino e indicando, em inglês, que pretendíamos ir até ao Rio Danúbio (não sei falar húngaro e tenho muita dificuldade em pronunciar foneticamente as palavras que leio).
• O funcionário ajudou-me a adquirir 2 bilhetes, numa máquina de venda de bilhetes à entrada da estação. A operação no visor da máquina decorreu sempre numa língua que não compreendo e que presumo ter sido húngaro.
• Depois disso expliquei ao funcionário que pretendia ainda outros 2 bilhetes, visto sermos 4 pessoas, apontando para o casal amigo.
• O funcionário pediu a esse casal o dinheiro para introduzir na máquina, mas aparentemente a mesma não funcionou, por razões que nunca consegui perceber.
• O meu amigo foi entregando moedas de 100 florins e sucessivamente notas de maior valor, até chegar aos 10 mil florins, mas o funcionário foi sempre dizendo que a máquina não funcionava com aquele dinheiro.
• Estávamos neste impasse, sem que eu percebesse qual era a origem do problema no fornecimento dos bilhetes (até porque da primeira vez a máquina tinha funcionado), quando a carruagem deu entrada na estação. Logo de seguida o funcionário, apontando para a carruagem, gritou em inglês: «go, go». Quando lhe expliquei que só tínhamos aqueles dois bilhetes, repetiu, imprimindo urgência à sua acção: «go, go, no problem».
• Algo “confusos” com esta atitude, entrámos a correr na carruagem e nem sequer nos apercebemos, nem disso fomos informados, de que teríamos de proceder à validação dos 2 bilhetes numa máquina de picotagem, tal o ímpeto com que fomos “empurrados” para dentro da carruagem pelo referido funcionário.
• Ao chegar a Vörösmarty Tér fomos interpelados por outros dois funcionários, igualmente fardados e com braçadeiras, à saída da estação, que presumi serem colegas dos dois primeiros. Explicaram-nos que tínhamos cometido várias infracções: em primeiro lugar havia duas pessoas sem bilhete. Em segundo lugar os 2 bilhetes de que dispúnhamos só permitiam viajar nas 3 primeiras estações a seguir à estação de entrada (!). Em terceiro lugar não tínhamos validado os bilhetes que possuíamos, procedendo à sua picotagem.
• Depois de termos explicado a esses funcionários o que tinha acontecido, nomeadamente que apenas tínhamos seguido as indicações dos seus colegas, fomos “ameaçados” com uma coima de 12 mil florins cada.
• Quando invocámos a imoralidade e injustiça de tal comportamento por parte de agentes em quem confiámos (no Ocidente temos o hábito de confiar em qualquer autoridade, sobretudo quando se apresenta fardada), fomos “ameaçados” com a vinda da polícia!
• Como não nos deixámos intimidar e manifestámos alívio e intenção de explicar tudo à polícia, requerendo nomeadamente a identificação e a audição dos funcionários que nos tinham ajudado a adquirir os bilhetes na estação de origem, e que nos tinham mandado avançar sem mais delongas, o episódio ganhou novos contornos.
• Enquanto um dos agentes fazia o papel do “mau”, o outro assumiu o papel do “bom”: propôs “perdoar” a coima às nossas esposas, desde que aceitássemos pagar, cada um dos cavalheiros, uma coima de 6 mil florins, que «seria a quantia habitual para os turistas estrangeiros».
• Como as nossas esposas já estavam irritadas com tudo aquilo, acabei por aceder. O casal amigo e a minha esposa saíram da estação enquanto eu procedia ao pagamento de 12 mil florins.
• Durante todo este episódio, que se estendeu por uns 10 minutos, verifiquei que tinha sucedido o mesmo com um outro turista estrangeiro, o qual no entanto pagou a multa que lhe foi solicitada sem protestar. Costatei na altura que não foi emitido a esse turista qualquer recibo pelo funcionário que recebeu o dinheiro.
• Por essa razão, logo que verifiquei que a minha esposa e o casal amigo se encontravam já fora da estação, exigi o recibo dos 12 mil florins. Foi-me o mesmo emitido com evidente hesitação e muita contrariedade, tendo eu finalmente compreendido o que verdadeiramente está a suceder no Metro de Budapeste.
• Só muito mais tarde, já em Portugal, ao observar com detalhe os bilhetes e o recibo emitido, me apercebi de que tinha sido emitido um recibo de apenas 6 mil florins, em vez dos 12 mil florins efectivamente pagos!
• Assim, tudo o leva a crer, o agente que recebeu o dinheiro apenas declarou à sua entidade patronal (Metro de Budapeste?) a quantia de 6 mil florins, em vez dos 12 mil florins recebidos, ou dos 24 mil florins formalmente exigíveis naquelas circunstâncias (coima para 4 pessoas)…
• Por tudo isto tomei a iniciativa de expor o assunto a V. Exa.
Está em curso uma “armadilha” para turistas. Não dispondo o Metro de Budapeste das condições existentes no Metro de outras cidades europeias, nomeadamente de controlos de passagem após a validação individual do bilhete (com torniquetes de rotação pessoa-a-pessoa), os turistas ficam muito dependentes da “ajuda” dos agentes presentes no local.
Estes, por sua vez, “criam” artificialmente uma situação de dificuldade na emissão dos bilhetes, optando ainda por não informar adequadamente os turistas sobre o método da validação dos bilhetes e sobre o pormenor de certo tipo de bilhetes só ser válido para secções de 3 estações! Apenas dispusemos de toda essa informação à saída, quando nos encontrávamos já numa situação de induzida ilegalidade.
A suspeita da existência de uma “armadilha” foi confirmada já no hotel, quando contámos o episódio a outras pessoas e nos afirmaram que tinha sucedido o mesmo com elas. Também essas pessoas se esqueceram de exigir o recibo das quantias pagas aos agentes, fazendo assim suspeitar que a entidade que gere o Metro de Budapeste nem sequer é a beneficiária de todas estas coimas.
O valor de cada coima ronda os 20 euros. Não me incomoda tanto a questão do dinheiro, mas antes o facto de ter percebido que aqueles agentes induzem os atrapalhados turistas estrangeiros a comportamentos que sabem que vão implicar coimas, retendo para si próprios – acredito eu – todas as quantias para as quais, na precipitação do momento, os turistas não tenham a presença de espírito para exigir a emissão de recibo.
Budapeste é uma cidade fabulosa e memorável. Contudo o lamentável incidente descrito dá da Hungria uma imagem muito pouco favorável, que acredito desagradar também aos responsáveis pelo turismo nacional húngaro.
Dito isto, convido V. Exa. a fazer tudo o que considere apropriado para informar os responsáveis do Metro de Budapeste desta situação e da necessidade de instalar outro tipo de controlos (automatizados) de entrada e saída de passageiros.
Seria talvez de toda a conveniência informar também os responsáveis pelo Turismo em Budapeste.
Ficaria muito grato a V. Exa. se me devolvesse informação que me permita acreditar que este tipo de artimanhas não mais ocorrerá no Metro de Budapeste e que tudo será diferente no futuro.
Estou à disposição para enviar uma versão desta comunicação em língua inglesa, se tal for conveniente.
Também me disponho a identificar formalmente a minha esposa e os nossos dois amigos e a fornecer depoimentos escritos individualizados acerca da ocorrência, se tal for considerado útil ou necessário.
Aproveito para apresentar, também em nome do casal amigo que connosco viajou, os nossos melhores cumprimentos