por Matias » domingo jun 03, 2007 10:12 pm
Tratando-se de uma história real, por motivos de segurança e privacidade somente meciono o nome dos intervinientes principais e a localidade onde costumam aparcar, no entanto estão à vossa inteira disposição aquando encontro ocasional para trocar impressões sobre a situação que vivem actualmente.
PRIMEIRA HISTÓRIA REAL DE UM "OUTSIDER"
O autocaravanista pela sua filosofia de vida, é um individuo ligado à natureza com uma percepção inigualável do que dela pode receber:
- os momentos calmos em contraste com os movimentos vibrantes do mar e dos
rios;
- o aumentar da sua energia com o melódico chilrear dos passarinhos;
- o barulho único do vento passando, como que, zangado por entre as
árvores;
- e… o forçoso bom relacionamento com as populações por onde passa.
O autocaravanista acaba por carregar a saudade visível nos seus olhos, quando por livre vontade se desloca de terra em terra, nunca autorizando que o privem da sua liberdade - que outros indevidamente tentam roubar-lhe.
A liberdade? Sim! Este valor tão alto que não se vislumbra mas, do qual não pode prescindir. E por isso, quando tal sucede - Luta. Agarrando todas as forças que circulam no seu interior. E mesmo que por momentos se sinta derrotado, essas suas forças mais tarde, ou mais cedo, virão em seu auxílio.
Por nisto acreditar, tomei a iniciativa de há dias atrás me ir despedir, mesmo que temporariamente da minha tão querida - zona da Ericeira.
Enquanto por lá ia passeando (com a minha mulher), com a lágrima no canto do olho e o sol a banhar-me o rosto , foi chegando suavemente a brisa do Norte amenizando a temperatura.
Senti-me impelido a sentar numa esplanada junto ao mar e saborear com os meus sentidos, o cheiro, que se mostrava com uma intensidade única no mundo.
Fecho os olhos…, e este aroma transporta-me para o meu subconsciente, relembrando-me e vislumbrando todas as boas recordações de duas ou três décadas de passeios por esta terra.
A esplanada escolhida foi a do jardim de S. Sebastião. Ao escolhermos uma mesa, sentámo-nos junto à mesa de um casal, mais ou menos da nossa idade
que se fazia acompanhar por uma criança, a qual presumimos ser neta .
Por inerência aos movimentos da pequena que criou uma empatia com a minha mulher acabámos nós, adultos por estar envolvidos em amena “cavaqueira”.
Tomei a iniciativa de me apresentar. Durante a conversa o Rafael disse-me que era autocaravanista , ou melhor, referindo as suas palavras, “não se considerava como tal, mas sim dono de uma autocaravana“.
Nesse momento, a minha curiosidade ficou deveras expectante. Logo, lhe pedi para me tentar esclarecer a afirmação, pois eu não a tinha percebido, e a impressão com que fiquei foi a de alguém que se negava a assumir-se como autocaravanista. Não conhecia ninguém que se nega-se, mesmo em locais não amistosos, com o autocaravanista.
O Rafael logo se dispôs a esclarecer-me tal afirmação.
Deu um balanço com o corpo tentando ajustar-se à cadeira, percebi de imediato que a explicação não ia ser breve.
Como estava com tempo, até porque a minha mulher e a Mariette (mulher do Rafael), tinham-se levantado e encaminhado para o parque infantil.
Então, o Rafael começou a falar um pouco da sua vida, contou-me que foi motorista da Carris, estando neste momento na reforma e a sua mulher, educadora infantil estava com baixa médica, e aguardava com expectativa
feroz a tão almejada reforma. Tinham vindo como retornados de Angola mas facilmente se integraram na sociedade portuguesa superando algumas
dificuldades colocadas no início.
Foram morar para Caselas, onde continuam até hoje.
Empregos estáveis , dois filhos (ambos rapazes), nascidos já em Portugal. A vida foi-se desenrolando com a maior das normalidades. Os filhos cresceram
, casaram e vivem actualmente com as respectivas mulheres.
Um dos filhos mora na Ericeira e o outro perto do Samouco.
Esta situação fez com que o Rafael e a Mariette, ficassem algo distantes dos seus dois filhos.
A distância e a saudade tornaram-se maiores com o nascimento dos netos, bem como a consciência de não estarem presentes nas suas vidas pois, os avós
maternos tinham esse privilégio, uma vez que, os respectivos filhos do Rafael e da Mariette moravam em casa dos sogros.
Então a resolução da situação passou pela compra de uma auto caravana.
Resolução tomada casualmente aquando das compras no mercado, devido a uma conversa com uma vizinha que tinha uma autocaravana.
Ficaram empolgados com a descrição de algumas viagem feitas pela dita vizinha. Após uma breve observação da autocaravana, chegaram à conclusão de
que tinham encontrado - A Solução Ideal.
A solução para as visitas aos netos ficou assim resolvida.
Estariam na Ericeira um fim-de-semana e o seguinte no Samouco.
Esperavam assim ter mais contacto com os netos, não incomodando os filhos.
A ideia foi aceite por todos os intervenientes de bom grado.
Por tudo isto, diz o Rafael :
- ressalvo sempre a minha condição de autocaravanista. E no que diz respeito à autocaravana , ultimamente foi o melhor que entrou nas nossas vidas, para além dos netos evidentemente.
E, tão brevemente , tanto a Mariette como eu, não pensamos abdicar deste estilo de vida, pois queremos acompanhar o crescimento dos nossos netos.
Não tenho computador, nem sei como funciona, mas também não sinto falta.
Falo com alguns amigos, apesar de me sentir um pouco aborrecido por falta de temas de conversa, pois os meus temas giram sempre em torno dos meus
netos, esquecendo-me que os outros também têm netos. Egoísta? Talvez! Avô babado? Sempre! Preciso falar! Preciso viver estes momentos únicos ! - Exclama o Rafael com uma alegria estampada no rosto e
com um sorriso de orelha a orelha .
Eu bem lhe tentei dizer que também eu tinha uma neta e que… também eu sinto uma alegria enorme, mas tive de me calar, pois o Rafael continuava num daqueles momentos em que os seus netos eram o seu mundo e não havia lugar para mais ninguém, por isso, estou com ele e deixo-o viver os seus momentos únicos.
O Investimento feito pelo Rafael na sua KNAUS 500 , foi fruto do seu trabalho de uma vida, desconhece qualquer norma que o proíba de seguir esta forma de vida, inclusive coloca-se à disposição de quem o quiser interpelar, nos locais que habitualmente frequenta, para trocar ideias sobre o assunto.
Nada mais há a acrescentar a esta história real, a não ser uma pequena nota pessoal.
O Rafael não se intitula um Autocaravanista, mesmo possuindo e utilizando uma autocaravana , sendo uma pessoa respeitadora de tudo e todos, creio que
merece o nosso apoio, nesta enternecedora parte da sua vida.
Acho que temos aqui um Bom conteúdo para trocarmos impressões.
Matias